"Quando a exigência esportiva dos pais prejudica o resultado dos filhos"
O pilar mais forte da estrutura
de desenvolvimento de uma criança em qualquer esporte não é o professor ou o
método, mas sim a influência que esta criança recebe em casa, dos pais e da
família de um modo geral. Por melhor que seja o professor, é quase impossível
manter motivada uma criança que entra numa atmosfera negativa assim que sai de
um treino ou de uma competição.
Um dos problemas mais comuns que
tenho observado, é o de pais que muitas vezes são muito ansiosos pelos
resultados esportivos de seus filhos. Mais até do que os próprios filhos. Não
conseguem segurar a frustração de verem-nos derrotados em uma competição, ou
estão sempre de olho no desempenho dos treinos, muitas vezes atuando de fora do
tatame como um “segundo técnico”. Este tipo de pai está sempre acompanhando a
criança e geralmente até aprende todas as regras do esporte. Não que isso seja
ruim, isso é ótimo, mas com limites. E o limite é justamente quando isso se
torna uma pressão adicional sobre o aluno.
Nem sempre se trata de um sonho frustrado
do pai. Às vezes é apenas a vontade de ver o filho bem-sucedido no esporte, um
campeão… talvez um futuro atleta olímpico.
Quem não deseja o melhor para os
filhos não é mesmo? Acontece que a pior forma de conseguir um resultado desses
é com pressão desnecessária. O pior mesmo é que as vezes esta pressão começa
muito cedo.
Hoje em dia temos competições de
judô da categoria mirim e infantil, onde competem crianças de 5 a 10 anos.
Várias vezes em que arbitrei nestas competições fiquei muito triste ao ver pais
na beirada do tatame esbravejando, desrespeitando os árbitros e brigando com
filhos que perderam. Isso é no mínimo, ridículo. Uma péssima influência e uma
pressão psicológica insuportável para uma criança dessa idade. Se isso gera
algum resultado, são os piores possíveis. Aumento da ansiedade nas próximas
competições, desmotivação no treino e até perda de interesse pelo esporte são
os reflexos mais comuns. Mas, em casos mais específicos, por exemplo, para
crianças que competem regularmente no alto nível, a exigência de rendimento dos
pais pode resultar em quadros depressivos.
Como professores, é importante
sabermos o momento de intervir quando pais e familiares apresentam este
comportamento com os filhos. Precisamos saber o momento pois nem sempre a
primeira vez que um pai pressiona o filho é um sinal de que ele sempre impõe
uma exigência de resultado. Percebo que muitos destes pais não compreendem o
real significado do judô e o quanto ele vai além da competição para beneficiar
a criança de um modo geral. Um dia desses uma avó de um aluno (vejam que nem
sempre são os pais diretamente) me abordou no fim durante uma competição e
disse, na frente do próprio: “Nossa, o Fulaninho é muito mole lutando né, ele
já treina faz tantos meses, porque será que ele não luta melhor?”. Na hora, vem
aquela vontade de dar uma bronca na avó. Mas isso com certeza traria um atrito
desnecessário se a “bronca” fosse mal interpretada.
Precisamos perceber que do
lado de quem é leigo, o pensamento é mais ou menos o seguinte: “O judô é uma
luta, meu filho não está conseguindo lutar, então meu filho não se deu bem com
o judô.” Neste caso a avó não percebeu que o Fulaninho era um menino muito
tímido quando entrou no judô, mas hoje, depois de alguns meses, já está muito
mais extrovertido, interage e se diverte muito mais, mas na hora do randori,
ainda continua um pouco tímido. É só uma questão de tempo para que ele evolua
neste aspecto também.
Por outro lado, se o pai tem uma
tendência de pressionar de forma mais agressiva ou frequente, é bom ter uma
conversa com ele, a sós, longe da criança e explicar de uma forma moderada como
isso atrapalha o próprio desenvolvimento desta no esporte. Diga a este pai que
a competição é uma parte pequena do judô e mostre com argumentos como seu filho
já teve tais e tais evoluções em outras áreas. Claro que nenhum professor quer
ter essa conversa, mas se for necessário, tenha. Não deixe passar e virar algo
que traga problemas maiores depois.
A melhor forma de não ter esta
conversa é sempre deixar claro para os pais e alunos, durante os treinos ou
fora deles, quais são os principais valores do esporte. Sempre tenha conversas
aos fins de treino com as crianças para que os pais de fora ouçam e aprendam
sobre tudo isso.
Se você é pai de um judoquinha e
está lendo este post, gostaria de deixar algumas dicas sobre como se comportar
a respeito:
- Jamais crie climas de rivalidade. Não aconselhe o técnico sobre como dar aulas ou como treinar seu filho;
- Se o técnico orientou seu filho sobre como lutar em tal competição, não “passe por cima” orientando de outra forma;
- Jamais faça comentários depreciativos contra técnicos, árbitros ou outros atletas na frente da criança;
- Permaneça na área de espectadores durante a competição;
- Tome cuidado com críticas e comportamentos negativos quando a criança perder uma competição ou tiver um mau desempenho;
É preciso entender muito bem este
último para pôr em prática. Não quer dizer que você deva sempre premiar a
criança quando ela perder, dizer que está tudo bem, porque no fundo ela sabe
que não está.
Aliás é bom permitir que ela sinta e assimile a derrota por um
tempo, mas sozinha. Ela não precisa que você também sinta o mesmo mal. O que é
essencial neste último tópico é que, depois de um mau desempenho, é importante
estar ali presente para qualquer coisa, oferecer o ombro, dar uma palavra de
apoio e incentivo e ver o desenrolar da coisa.
Procurar ser sempre o mais
positivo nessa hora, e tomar cuidado para que a linguagem corporal não diga o
contrário do que você está querendo dizer. A melhor forma de ter este
comportamento é entender de verdade o quanto o judô é completo para a formação
do seu filho. Assim você vai ver que o incentivo vale muito mais que a sua
cobrança e que mesmo que ele não consiga ser um campeão olímpico, trilhando
este caminho, ele será um campeão na vida.
FONTE: http://ojudoca.com.br/2016/02/01/quando-a-exigencia-prejudica-filhos/